Pois nele habita corporalmente toda a plenitude da divindade. (Cl 2,9)
Meditação de São João Paulo II:
1. Desde o mês de junho, nos domingos de verão, nosso Angelus vem buscando motivos de reflexão na ladainha do Sagrado Coração de Jesus. Fazemos uma pausa em cada invocação e meditamos a grande riqueza de conteúdo que ela encerra. É uma fonte de inspiração para nossa vida interior, em nossa relação com o mistério de Jesus Cristo.
2. Ontem, na solenidade de Exaltação da Santa Cruz, toda Igreja se abriu uma vez mais ao Coração no qual "reside toda a plenitude da divindade". O mistério de Cristo: o Deus Homem se reveste de uma eloquência particular quando olhamos para a Cruz. Eis o Homem! Eis o Crucificado! Eis o homem totalmente despojado, "quebrado por nossos pecados". Eis o Homem "recoberto de opróbrios"! Ao mesmo tempo, eis o Homem Deus! Nele reside toda a plenitude da divindade. Ele é da mesma substância que o Pai. Deus de Deus, Luz da luz! Gerado, não criado! O Verbo Eterno. Um na divindade com o Pai e o Espírito Santo.
3. Quando, no Gólgata, o centurião traspassou com uma lança o Crucificado, de seu lado jorraram sangue e água - sinal da morte; sinal da morte do Deus imortal.
4. Ao pé da Cruz estava sua Mãe - a Mãe das Dores. Nós a recordamos na manhã da Exaltação da Santa Cruz. No momento em que o lado de Cristo é traspassado pela lança do centurião, realiza-se nela a profecia de Simeão: "Uma lança te traspassará a alma" (Lc 2,25).
As palavras do profeta são um anúncio futuro da aliança definitiva dos Corações: o do Filho e o da Mãe; o da Mãe e o do Filho. "Coração de Jesus no qual reside toda a plenitude da divindade". Coração de Maria - Coração da Virgem das Dores - Coração da Mãe de Deus. Que nossa prece do Angelus Domini se funde hoje com essa admirável aliança de Corações.(Angelus - 15 de setembro de 1985)
O Padre Paschoal Rangel (1993) afirma que esta invocação certamente se inspirou na palavra de São Paulo: Deus Pai se compraz em fazer habitar em Cristo toda a plenitude da divindade (Cl 1,19), mas, também, como apontado na epígrafe, na mesma Carta, mais adiante (Cl 2,9).
Na Escritura, a palavra "plenitude" indica abundância, o conteúdo completo de alguma coisa: "Do Senhor é a terra e sua plenitude" (Sl 23,1), isto é, tudo o que ela contém. Ou como está nos Provérbios (19,23)... "O temos do Senhor conduz à vida e nele se vive em abundância".
No caso de Cristo, certamente se pensa em abundância, em afluência de todos os dons divinos. A linguagem cristã ocidental, com certeza, inclui nessa "plenitude", mais que o de "abundância", o sentido de "completude": é toda a divindade que nele habita. O mais provável é que São Paulo não estivesse pensando na "imanência" da divindade em Cristo. Apesar de viver num mundo helenizado, ele era "hebreu e filho de hebreus", foi educado em Jerusalém, aos pés de Gamaliel (At 22,3), e, regra geral, pensava como um judeu. O mais provável é que, falando da "plenitude da divindade" em Cristo, ele estivesse pensando, como pensaria um judeu, muito mais na abundância da Sabedoria, no Poder de Cristo, que atua sobre o mundo e a vida dos homens. Mas é significativo que ele tenha escolhido a palavra "habitar". A mesma palavra se encontra Colossenses (2,9): "Nele (em Cristo) habita corporalmente toda a plenitude da divindade". Aqui, parece inevitável pensar que São Paulo falava numa presença imanente da divindade de Cristo.
Desse Deus pleno e cheio de todos os dons todos nós participamos ou somos chamados a participar: "E de sua plenitude todos nós recebemos" - escreveu São João, logo no início de seu Evangelho (Jo 1,16). Ele é a fonte de onde tiramos todas as graças e dons de Deus, sem que ela jamais seque.
Se nele nos alimentamos, é também para ele que acorremos, não só para "tirar" dele, mas para unir-nos a ele, para crescermos com ele, nele. Mais uma palavra de São Paulo, cheia de beleza e sabedoria: "Cristo mesmo nos convoca para "construirmos o seu Corpo", seu Corpo Místico, e quer que "acorramos todos à unidade da fé e do conhecimento do Filho de Deus, que cresce conosco até ser homem perfeito, até atingir a estatura da plenitude de Cristo" (Ef 4,11-13).
É esse Cristo pleno que invocamos na Ladainha.
Notas:
RANGEL, Paschoal. Sagrado Coração do Homem. Belo Horizonte: O Lutador, 1993.
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